Como fã ávida de jogos de plataformas e aventura (mais propriamente os metroidvanias, na verdade), estes olhos gelatinosos quase saltam das órbitas quando vislumbram diferentes pisos na horizontal. E foi precisamente isso que aconteceu ao ver imagens de “The Company Man”, especialmente quando compreendi que o personagem principal está farto do trabalho e começa a lutar contra os colegas e chefes.

Ora, é precisamente aí que o jogo da Forust consegue ressaltar dos restantes típicos ou já gastos conceitos utilizados nos diversos jogos 2D de plataformas. Aliás, deu aqui uns flashbacks das horas perdidas em “SuperEpic: The Entertainment War“. E, de facto, têm as suas semelhanças, principalmente na crítica humorística ou sarcástica que retrata as corporações e grandes empresas como vilãs.

Jim é o “The Company Man” que acabou de se formar na universidade e lança a sua carreira épica na Good Water Company. Já aqui se vê que isto é mera ficção, porque no mundo real ninguém sai da universidade directamente para um emprego. *chora*

O pobre Jim percebe a alhada em que se meteu e acaba por entrar num frenesim louco. Ao ver que não consegue escapar do edifício, o nosso persistente personagem trabalha para se tornar o CEO da empresa e corrigir tudo pelas suas próprias mãos. Por isso pega no teclado para esbofetear todos os que se atravessarem à frente dele. Boa forma de mostrar aos outros como se faz melhor, não? Os chefes também não acham piada por personificar, literalmente, a palavra “boss” dos videojogos. Mas têm que levar com a constante pancada.

No entanto, depois de uns primeiros minutos de entusiasmo pelo conceito acompanhado dum olhar deliciado com os visuais 2D, depressa a opinião de “The Company Man” acaba por se esmorecer.

O trabalho artístico está impecável e é provavelmente aquilo que salva o jogo duma nota pior. Dá vida aos vários departamentos da Good Water Company e aos diferentes personagens. Estes últimos não se cingem ao nosso Jim, que tem sempre uma animação cómica quando corre, ou aos diversos inimigos e bosses. Em algumas áreas, temos até os desgraçados dos trabalhadores presos em salas e jaulas, com as suas pilhas de papel para percorrer até à eternidade. O detalhe está em todo o lado, nos diferentes planos da imagem e nas dezenas de bordas de livros que se vê nas estantes.

Enquanto o nosso querido representante de tantos empregados deste sistema capitalista vai explorando os escritórios em busca de justiça, vamos encontrando outros trabalhadores que vão tentar impedir-nos. Nos Recursos Humanos, por exemplo, temos pessoal a dar-te com um livro na cara, ou a atirar aviões de papel. E há quem caminhe com autênticas torres de papelada, provavelmente para deitar nas trituradoras de papel (que também podem desfazer-te em pedacinhos). A determinada altura, tens um que liberta as suas flatulências para se deslocar na sua cadeira. A criatividade para trazer diversos temas e inimigos é notável, merecendo todos os elogios desde o desenho e conceito às animações fluídas e engraçadas.

A jogabilidade, por seu lado, é o verdadeiro turn off do jogo. Tanto tem de falhas como aspectos onde poderia melhorar. Da forma mais curta, “The Company Man” simplesmente não dá gosto de jogar. Acaba por tornar-se aborrecido com a simplicidade do desenho estrutural dos níveis; com a aparente tentativa de colocar puzzles para que a progressão entre as plataformas não pareça demasiado fácil; os inimigos que nem apresentam barra de vida; e lutas com bosses que não são desafiantes o suficiente para entusiasmar.

O jogo é até difícil, mas não de forma necessariamente equilibrada. Há um certo esforço estranho entre as diferentes pausas para café (sim, aqui elas também renovam o trabalhador). Entre um determinado número de inimigos, podemos conseguir ou não lidar com eles, mas as opções são um pouco limitadas. O combate não parece ter sido um ponto essencial no desenvolvimento, e por isso torna-se irritante tentar lidar com diversos estilos de oponentes que conseguem dar dano de diferentes formas, enquanto o desgraçado do Jim tem apenas um teclado para combate corpo-a-corpo, e e-mails de curto alcance para atirar.

As lutas por vezes tornam-se injustas, independentemente da performance de quem está a jogar. Não há forma de defender sequer, e nem sempre um salto ou desvio ajuda. Tendo uma desvantagem na maioria das lutas, estas podem tornar-se frustrantes e dei por mim a ter que fazer pausas do jogo após alguns minutos.

Isto estende-se até aos bosses, onde nem sequer temos uma barra de vida, ou diferentes fases, para ter alguma noção do nosso progresso. Aliás, tive que ganhar coragem e paciência pelo menos três vezes quando me deparei com um bug após derrotar a Nadia da Contabilidade, forçando-me a sair do jogo e voltar a entrar, para descobrir que nem sequer gravou. A câmara que permanecia presa na área do combate quase me levou a desistir de vez, até que consegui desenrascar-me e levar o Jim (às cegas) até ao chairman para mais um upgrade.

E nem estes facilitam tanto a vida. Sou uma naba, por natureza, em combate nos videojogos (deve ser por isso que não gosto de jogos de luta), mas há que saber desenhar a linha ente a incompetência e um sistema desequilibrado. O segundo parece ser o caso de “The Company Man”.

No fim, “The Company Man” acabou por não marcar pela quantidade de coisas que simplesmente lhe faltam, como uma narrativa que sensibilize mais o jogador, e jogabilidade que seja mais entusiasmante. Mas talvez seja aquilo que muitas vítimas – trabalhadores – das empresas estão a precisar: de pegar num teclado e andar à marretada com toda a gente do escritório. Se for o caso, provavelmente esta será uma boa aposta, que ainda vem carregada de piadas e referências. Por exemplo, só ganhas o teu salário quando derrotas colegas de trabalho e chefes! Este jogo é feito para o trabalhador comum das grandes empresas que continuam a escravizar o ser humano.

Boa sorte! Se perderes, acabas por ter de arrumar a tua caixa de tralha (cenoura incluída) e ir embora. Eu, infelizmente, apresento a minha demissão, com a esperança que a Forust encontre jogadores mais indicados para esta posição.

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Código de review foi providenciado pelo Evolve PR, através do Terminals
Foi utilizada uma Xbox Series X e TV LG OLED 4K para esta review